Pessoal, este é o penúltimo capítulo de "Destino". Espero que estejam gostando.
O que vocês preferem que seja postado depois? Livros inteiros, capítulos longos ou curtos? Contos? Crônicas? Vocês decidem!
Décimo terceiro capítulo:
http://asleiturasdamila.blogspot.com.br/2014/04/no-meu-mundo.html
Décimo quarto capítulo:
http://asleiturasdamila.blogspot.com.br/2014/05/no-meu-mundo.html
Décima quinta carta
aqui: http://www.4shared.com/office/eH7qWcfOce/15_Carta_de_Natlia_para_a_Fnix.html
DÉCIMA
QUINTA LIÇÃO – Promessas e Milagre...
—
E então?
—
Então é isso!
—
O que faremos agora?
—
Vamos nos despedir e iremos embora.
—
Você está certa disso? Pode não ter outra chance de se aproximar dele tanto
assim. E ainda não fez o que veio fazer.
—
Eu nem sei mais o que vim fazer aqui, Andrew. Foi uma grande loucura. Eu não
deveria tê-lo incomodado com isso. Agora estou me sentindo muito pior do que
antes, uma destruidora de sonhos, de vidas.
—
Ora, não exagere! Foi uma deliciosa loucura! Ele está me parecendo bem feliz, e
não tirou os olhos de você nem por um segundo. É impressão minha ou ele a reconheceu?
—
É claro que não me reconheceu, como poderia? Ele sequer acredita nessas
histórias de vida após a morte, reencarnação, embora tenha deixado bem claro
que crê em Deus. Ele disse, inclusive, que Deus teria aparecido para ele para
lhe mostrar como era egoísta, e colocou uma menina em seu caminho.
—
Uma menina?
—
Sim, mas essa é uma longa história. Mais tarde lhe conto.
—
Está bem. Olhe, ele está voltando. — Andrew disfarçou. Não queria que escutasse
que estivera fofocando com Natália enquanto ele tinha ido ao banheiro. Sorriu e
depois riu alto, como se acabasse de ouvir uma piada muito engraçada. Natália
não entendeu, mas riu também.
Já
era tarde da noite. Haviam terminado de jantar fazia tempo, mas cada vez que se
levantavam para ir embora, o piloto insistia em que ficassem mais um pouco e,
dessa forma, o tempo passara e eles não se deram conta de que já passava da
meia- noite. Conversaram sobre coisas banais, ele contou algumas curiosidades
para Andrew, que de uma hora para outra, tornou-se um dos maiores fãs da
aviação. Sentia-se especial por ter conhecido alguém importante, parecia um dos
meninos que corriam pelos aeroportos, implorando um minuto com o ídolo.
Natália, o oposto de Andrew, ficava mais nervosa a cada minuto que passava,
tentando inventar uma desculpa para sair logo dali, despedir-se e ir embora o mais
depressa possível. Não porque não gostasse de estar na companhia do homem dos
seus sonhos, pelo contrário, adorava estar a seu lado, mas cada momento a mais
que permanecessem juntos, tornaria mais dolorosa a hora do adeus.
—
Bem... então vamos, Andrew? — convidou ela, mais uma vez.
—
Ainda é cedo, por que não ficam mais um pouco? A noite ainda é uma criança!
—
Eu preciso descansar, acho que ainda não me recuperei da noite de ontem. E como
hoje não teve vinho... — os três riram. Mais uma vez ela sentiu-se torturada
pelo sorriso do piloto, a alegria dele doía no peito de Natália. Ela não queria
ir embora, descobriu que não estava preparada para morrer, conforme imaginara.
Agora ela queria viver. Justamente quando descobriu que não devia alimentar
mais nenhum desejo, foi que seu verdadeiro desejo aflorou. A cada instante, com
mais e mais forças, desejava aquele homem. Não apenas fisicamente ou como nos
sonhos das fãs que tanto o almejavam. Desejava fazer parte da sua vida, ser
feliz com ele, compartilhar a felicidade que ele trazia em si e dividir o que
ela tivesse de melhor para oferecer. Agora que restava tão pouco tempo é que
fora conhecer o amor. O amor que estava guardado em algum canto da sua alma e
que ela nem fazia ideia de que possuía. O amor do qual tantas vezes ouvira
falar e que pensava compreender, mas que não compreendia. O amor não se traduz
em palavras. Só se pode compreender o amor sentindo-o. Ele era maravilhoso e
terrível ao mesmo tempo. Maravilhoso como estar perto daquele homem, poder
olhar o seu rosto, admirar seu sorriso e terrível como ter de deixá-lo.
Deixá-lo por esta noite. Deixá-lo para sempre. Para que prolongar as coisas que
deveriam ser abreviadas? O adeus era inevitável, então retardá-lo seria
retardar também seu sofrimento, sua agonia. Era preciso ter forças. Não somente
para a despedida, mas para depois dela também. Teria de ser forte para
impedir-se de sair correndo atrás dele, toda vez que a saudade e o desejo apertassem
seu coração. Ela sabia que mesmo depois que voltasse para sua cidade, sua vida
jamais voltaria a ser a mesma. Ele não sairia mais da sua cabeça e ela se
permitiria, de vez em quando, buscar por notícias suas. Quem sabe assim,
matasse um pouco da saudade que já estava se apossando dela, apenas em pensar
que precisava ir embora, para muito longe, e que certamente, os dois não
tornariam a se encontrar.
—
Está bem, mas eu faço questão de levá-los até o hotel. — disse ele levantando a
mão para que o garçom trouxesse-lhe a conta — E, por favor, não saiam da cidade
sem mim. Já providenciei o jatinho para levá-los para casa, o mais breve
possível.
—
É claro! Vou adorar dar uma voltinha pelo céu! — respondeu Andrew, excitado.
Natália olhou para ele, condenando-o de certa forma, porque essa era uma
decisão que cabia exclusivamente a ela. Tentando arranjar uma desculpa para
recusar o convite, corrigiu:
—Não,
é melhor voltarmos por terra, da mesma forma que viemos.
—
Mas é uma viagem muito longa e cansativa, não faz sentido voltarem de ônibus.
Como eu disse, já loquei o avião para levá-los de volta.
—
Oh, mas não será necessário... — Natália parou por um momento, não havia o que
dizer para convencê-los, Andrew também tentava convencê-la a aceitar e, por
mais que ela quisesse, tinha medo. Medo de morrer junto com ele mais uma vez.
Não teve alternativa, senão dizer a verdade.
—
Eu tenho medo de voar. Prefiro manter meus pés firmes no chão.
—
Ah, o que é isso! Assim vou pensar que você está duvidando da minha competência!
— brincou ele, fazendo cara de ofendido, mas com aquele sorriso apertado no
canto da boca — Vamos comigo! Eu insisto! Prometo que tomarei cuidado!
—
É melhor não...
—
Não vou aceitar uma recusa sua! Eu faço questão de devolvê-la na porta de casa.
Ora, você não veio de tão longe por minha causa? Então deixe-me ir tão longe
por você.
—
Ah, está bem! Embora eu ache totalmente desnecessário...
—
Não tem perigo, eu lhe garanto! Vai ser como pilotar um carrinho de rolimã!
Ele
pagou a conta e pediu ao manobrista que trouxesse o carro que alugara
especialmente para aquela noite. Comportou-se como um cavalheiro, abriu a porta
do carro para ela, tirou o casaco e o pôs em seus ombros para evitar que o
vento gelado açoitasse a pele desnuda, que o decote lateral do vestido deixava
à mostra. Andrew observava cada passo do seu mais novo ídolo, cada gesto, cada
palavra. Ele estava se apaixonando por Natália. Era inevitável o reencontro.
Agora ele quase podia sentir o elo que os unia e que certamente existia há muito
mais tempo do que julgara. Eles pareciam mesmo feitos um para o outro e até
mesmo alguns traços do rosto do homem, especialmente quando expressava certos
sentimentos, se pareciam com os de Natália. Mas o que mais intrigou Andrew foi
o olhar daquele homem. No fundo daqueles olhos podia-se ver muita tristeza,
muito sofrimento acumulado por conta das dificuldades desta vida, ou de outras.
Aqueles olhos que traziam a mesma dor que os de Natália, e por vezes, o mesmo
vazio de quem se via condenado. Ele sabia que ela lhe contara sobre sua doença
e que ele, mesmo que não tivesse acreditado, conforme demonstrava ficara tocado
com a história da moça. E Andrew entendia que assim fosse, pois não são todos
os dias que alguém atravessa um país inteiro em busca de alguém, apenas para
lhe pedir que se cuidasse, para tentar salvar-lhe a vida, como ela fizera.
Entraram
no carro. Natália ao lado dele, sem dizer mais nenhuma palavra. Percebia quando
ele olhava para ela, o olhar como uma chama que invadia o coração dela e fazia
sua face enrubescer. E a cada vez que a olhava, parecia ser a primeira vez.
Sentia-se uma adolescente, pura, inocente que ainda não havia sentido desejo
por homem algum, como se ele fosse o primeiro e o único e os outros nunca
houvessem existido. Na verdade, em cada
momento que ficara ao seu lado, sentira o mundo parar. Ele, e somente ele,
podia preencher dentro dela o vazio e a ausência de todo o resto do mundo.
Ele
dirigiu devagar, como se quisesse prolongar a viagem ao máximo. Natália não
sabia se aquilo era bom ou ruim, apenas nutria a certeza de que jamais
esqueceria cada centímetro que percorrera ao lado dele. Seria capaz de refazer
o trajeto de olhos fechados, pois prestara atenção a cada detalhe, às ruas, às
luzes da cidade, aos bares, e tudo isso faria em breve, parte de uma história,
a sua história ao lado daquele homem. Lembrou-se de como era a sua vida antes
de descobrir que estava doente. Há algumas semanas, ela era simplesmente uma
secretária, uma pessoa comum que passava seus dias indo do trabalho para casa e
de casa para o trabalho, e que adiava seus sonhos para amanhã, sem saber que
amanhã é um dia que nunca chega, e que vivia em função do ontem, sem se dar
conta de que o ontem nunca mais voltaria e não poderia ser alterado. Passara
toda a sua juventude nessa mistura de arrependimento e metas mal planejadas,
que ela sabia serem impossíveis, e que fazia questão de mantê-las assim, porque
era muito mais fácil almejar o impossível a ter coragem de realizar o alcançável.
Esse pensamento a fez perceber como mudara tanto, em pouquíssimo tempo. Seria o
amor tão poderoso assim? Ou isso era coisa do desejo ou da paixão que fazia o
mundo girar? Fosse como fosse, o motivo era ele, a quem ela julgara quase
intocável e que agora estava ali ao seu lado, inventando mil desculpas para não
deixá-la partir sem lhe dar mais um momento. Como poderia ter imaginado tanta
loucura... loucura maravilhosa, como
Andrew costumava dizer.
—
E tem mais uma coisa que eu gostaria de pedir a vocês, antes de partirem. — ele
quebrou o silêncio de repente, tirando bruscamente Natália do delírio de pensar
que aquele instante seria eterno, que jamais deixaria de estar ao lado dele, em
segurança e que o seu hotel estaria cada vez mais e mais longe, que nunca
chegariam ao destino, que não precisaria se despedir, nunca mais.
—
É claro, pode dizer! — respondeu Andrew, que ainda estava eufórico e que estava
também curtindo viver aquele sonho.
—
Eu queria muito que vocês comparecessem amanhã, a minha apresentação. Já
consegui resolver o problema do motor e decidi fazer o que vim fazer, antes de
partir. Sei que depois será muito difícil retornar para cá, minha agenda está
cheia até o final do ano. Não quero deixar de cumprir meu compromisso com esta
cidade.
—
Amanhã... mas... nós... — balbuciou Natália, numa mistura que ela julgou ser
nervosismo e ansiedade.
—
Eu admito que insisti para voar amanhã porque adoraria que vocês vissem.
Garanto que não vão se arrepender!
—
É claro que nós vamos! — adiantou-se Andrew, antes que ela pudesse pensar em
recusar o convite.
—
Que ótimo! Eu prometo, assim que o espetáculo acabar, levá-los-ei imediatamente
para casa. — ele parou por um instante, olhando para ela, como se tivesse
notado o pavor em seus olhos — Estarão em casa antes do entardecer. Eu prometo.
Ela
não teve forças para responder. O medo se apossara da sua alma. Tivera
esperanças, ainda que cruéis, de que o avião não pudesse mais ser consertado,
para que ele não tornasse a voar. Segundo ele dissera, ela era egoísta demais
e, mesmo sabendo o quanto ele sofreria, ela continuava torcendo para que
parasse de voar. Isso jamais aconteceria, e seria obrigada a assistir àquela
tortura calada, e fazer de conta que estava gostando, para não magoá-lo. Ela
queria muito desfazer a afirmação de Andrew. Gritar, esbravejar, talvez. Mas
não pôde. Não teve forças para dizer sequer que não iria. Olhou-o nos olhos e
viu a sua súplica silenciosa que, quem sabe, não se devesse ao fato de ela ir
ou não assistir ao espetáculo e que poderia ser simplesmente para ter um pouco
mais de tempo a seu lado. Ela sentiu-se ambiciosa ao extremo, porque era
ambição pensar que um homem como ele expressasse qualquer tipo de interesse por
uma mulher como ela. Ele poderia não ter conseguido agendar o show para outra
ocasião e, por isso, não poderia levá-la para casa logo conforme prometera, e
já que não desejava desapontá-la — e desapontar Andrew também, porque os ambos
pareciam ter feito amizade nesses dois dias que se passaram — dera como
desculpa a ideia de que queria que os dois estivessem presentes para vê-lo.
—
Então, boa-noite! — despediu-se Andrew, e desceu do carro. Natália fez menção
de abrir a porta, mas ele segurou-lhe a mão. Ela olhou-o, não entendeu o que
queria. Andrew já entrara pela porta de vidro da portaria e ela viu quando
entrou no elevador, sem ao menos olhar para trás, para ela.
—
Eu queria ficar um minuto a sós com você. Eu precisava. — falava ele, enquanto
acariciava a mão dela com seus longos e ágeis dedos. Ela olhava para sua mão,
entrelaçada na dela, sem coragem de olhá-lo nos olhos — Eu queria que soubesse
que eu acredito em você.
—
Acredita?
—
Acredito. Mas não de uma maneira religiosa, ou que eu tenha aderido à doutrina
espírita. Eu simplesmente acredito em você. Eu tenho que confessar que quando a
vi pela primeira vez, quando você entrou naquele hangar, acompanhada do seu
amigo, eu pensei já tê-la conhecido antes. E a ele também. Quando me disseram
que eram repórteres, eu procurei nos meus pensamentos em qual evento os teria
encontrado. É lógico que não consegui me lembrar. Então você quis me dizer
alguma coisa, mas não conseguiu, e foi então que eu tive a certeza de que já a
conhecia de algum lugar. Foi como se eu já tivesse vivido aquela cena antes e
soubesse exatamente o que aconteceria depois. Você não saiu mais da minha
cabeça nem a esperança de me lembrar de onde eu a conhecia. Fiquei pensando
nisso o resto do dia. Atendi aos outros sorteados e voltei para o hotel,
pensando. Foi aí que resolvi ir pessoalmente até o seu hotel, entregar a tal
entrevista. Precisava vê-la mais uma vez, para ver se minha memória clareava.
—
E então?
—
Então, eu soube de onde a conheço. Dos meus sonhos. E digo isso com toda
certeza, porque na noite de ontem, eu tive o mesmo sonho mais uma vez, quando
cochilei enquanto velava o seu sono e olhava para você. — Natália ergueu os
olhos, encarando-o. Que história inacreditável, ele também a vira em seus
sonhos! Teriam sido tão desagradáveis quanto os dela? Teve vontade de
perguntar, mas seus lábios não se moveram, esperando que a resposta viesse
espontaneamente — Já faz muito tempo. Nem sei como me lembrei disso, como a
reconheci. Foi mais ou menos na época em que eu entrei na escola de voo. Tive o
sonho mais de uma vez e enfiei na cabeça que iria encontrá-la. Com o tempo, as
responsabilidades foram aumentando, o tempo diminuindo e eu acabei esquecendo.
Mas passei um bom tempo prestando atenção em cada rosto, em cada mulher que se
aproximasse de mim, tentando encontrar seu semblante.
—
Você tem certeza de que era eu? Se já faz tanto tempo, se já se havia esquecido
completamente do sonho, pode ser que tenha se enganado. Ou apenas me associado
a alguém que você realmente conheceu!
—
Não foi isso que aconteceu. Você acha que quando me via nos seus sonhos era a
sua imaginação apenas? — ela fez um sinal negativo com a cabeça — Eu também não
creio que tenha sido a minha imaginação. Foi muito real. E estou certo de que
nunca conheci alguém parecida com você. Por favor, entenda como você é
importante para mim...
—
Como posso ser? Você ainda não me conhece...
—
Eu já a conheço o suficiente. E acredito que o mesmo acontece com você em
relação a mim. Perdoe-me pelas coisas que disse hoje de manhã. Eu estava
fugindo. Não de você, mas de mim mesmo. Tentando me convencer de que havia uma
explicação racional para tudo o que está acontecendo, e queria também
convencê-la. Mas eu estava errado. Por que precisamos sempre nos refugiar em
algo racional, quando na verdade as coisas mais lindas da vida não fazem o
menor sentido? A vida em si, não tem explicação. Nem o destino, nem o amor... —
Ele segurou-lhe o queixo, virando suavemente o rosto para si, enquanto ainda
afagava a mão dela, e aproximou-se devagar. Beijou-lhe os lábios ternamente,
como se este fosse o seu primeiro beijo. Sentiu-a estremecer, não soube explicar
se era prazer ou se era medo, porque também não conseguia definir o que ele
próprio estava sentindo.
—
Pare, por favor... — sussurrou ela, reunindo todas as suas forças para impedir
que o beijo continuasse. A culpa já tomara conta do seu coração por tê-lo
deixado se aproximar tanto. Deveria ter saído do carro junto com Andrew. Agora
era tarde, o beijo fora a confirmação do que ela mais temia: estar apaixonada,
perdidamente apaixonada por aquele homem. Era irônico que, depois de tanta
busca, quisesse fugir para bem longe dele. Mas não podia mudar o fato de que
estava condenada e em breve teria de partir. E ele sofreria...
—Desculpe-me,
eu não devia tê-la beijado. Eu estava fazendo o que o meu coração queria. Já me
arrependi tantas vezes por não escutá-lo, queria fazer algo diferente desta
vez. E o meu coração está chamando por você, Natália. — disse ele quase
sussurrando, olhando o ponto brilhante que se formava no canto dos olhos de
Natália, e que não tardou a se tornar uma lágrima salgada a molhar-lhe os
lábios.
—
Eu sei, também sinto a mesma coisa. Mas quero que você entenda que eu não tenho
muito tempo de vida, como já lhe expliquei. Não quero que sofra. Já perdeu
tantas pessoas a quem amava... Eu não quero ser mais uma.
—
Mas eu quero que você seja! Deixe que eu mesmo escolha o meu destino. Se eu
sofrer, é por que terei amado, e o amor nunca traz arrependimento. O sofrimento
será a prova de que tive coragem de amar você. E, acredite, está sendo muito
difícil estar aqui agora falando essas coisas. Você não imagina o quanto. Mas
você merece, também sofreu para chegar até aqui, para me contar tudo o que
contou. Você, mais do que ninguém, merece a minha confiança... e o meu amor...
—
Eu não estou pronta... quer dizer... eu não pensei que... eu não acredito...
—
Calma, querida. Eu também estou nervoso, veja. — ele ergueu as mãos trêmulas,
para que ela pudesse observá-las sob a luz que adentrava pela janela do carro —
Não tenha medo de mim. Eu só quero ser feliz, assim como você. E não repita
isso nunca mais!
—
Repetir o quê?
—
Que você tem pouco tempo de vida. A medicina está evoluindo muito rápido e pode
ser que amanhã o seu caso já tenha solução. Eu a levarei a especialistas, a médicos
que dedicam suas vidas a traumas como o seu. Tenho certeza de que eles vão
resolver o seu problema. E você ficará bem. E ficará ao meu lado para sempre.
—
Andrew me disse a mesma coisa, mas eu sinto que não estarei aqui, em breve. É
claro que pretendo procurar outro médico, mesmo que seja só para ter uma
segunda opinião, antes de me abrirem a cabeça — ela sorriu, ele ficou sério — mas
este é um daqueles pressentimentos sem explicação que a gente sente vez ou
outra.
—
Tenho certeza de que está enganada. Você vai ficar bem. — ele segurou-lhe as
mãos mais uma vez, apertando-as e aquecendo-as, sentindo o suor frio de
Natália. Beijou-as. Sentiu que não apenas queria aquela mulher a seu lado, mas
que precisava dela. Era como se a tivesse esperado por toda a vida, como se
tivessem sido amigos de infância e outra vez ele vasculhou a memória atrás de
alguma lembrança que a trouxesse para si. Não, ela não estava lá. Mesmo assim,
era como se sempre tivesse estado ao seu lado, ou como se ele tivesse passado a
vida toda em uma redoma, esperando-a para libertá-lo. Encontrá-la havia sido
como despertar de um sono profundo, em preto e branco, para ver que a vida
agora ganhara cores. Como pôde estar dormindo todo esse tempo? Essa era a
mágica do amor, da qual ele tantas vezes duvidara. Nada que tenha sentido por
qualquer outra mulher se comparava ao que sentia agora por aquela familiar
desconhecida. Sem explicação, sem razão nenhuma. Apenas a necessidade de tê-la.
— Eu prometo.
—
Você faz muitas promessas. Acho que não poderia cumpri-las. Há certas coisas na
vida que precisam acontecer e que não podemos mudar.
—
O destino, por exemplo? O que já foi escrito por outras mãos? Não creio. Nós
podemos sim, mudar a história. Vamos escrever a nossa. Não temos que seguir o
que foi escrito pelas mãos que nem sabemos de quem. Eu quero construir uma história
nova. Com você ao meu lado. Deixe-me mostrar isso, fique comigo — ele passou a
mão no rosto dela e ela sabia o que viria depois. Outro beijo, mais uma
lembrança que nunca sairia do seu coração. Mais um motivo para sofrer quando
ele estivesse longe. Seria apenas mais um dia, porém não o suficiente para
escreverem uma história juntos. Depois ela voltaria para sua casa, para sua
terra, para onde ele não iria, e ela estaria sozinha. Com o tempo ele também se
esqueceria dela. Estaria mesmo apaixonado? Ela queria muito acreditar, mas algo
em seu peito tocava um alarme, pois aprendera a confiar, sempre desconfiando.
Virou a face para o lado oposto, fugindo do beijo.
—
Por que ter medo? Medo do amor? Eu sei que assusta e não vou negar que também
sinto medo, mas afinal, não passamos a vida toda procurando o amor? Então para
que fugir agora que o encontramos? Veja se não é estranho, conheci você ontem e
já a amo como se sempre estivesse ao meu lado! E você ainda tem dúvida de que
isso seja amor? Deixe-me dar-lhe esse amor, porque ele não é de mais ninguém,
só seu. Aceite-me com todos os meus defeitos, com a minha agenda lotada,
acompanhe-me, siga-me, como tem feito, mas não fique longe de mim. — pedia ele
em um tom quase de súplica, sem saber que isso era tudo o que ela mais queria,
mas que ainda julgava ser apenas um sonho.
—
Eu irei vê-lo amanhã, já que Andrew aceitou o seu convite.
—
Você iria recusá-lo?
—
Creio que sim. Mas eu estarei lá. Tenha cuidado.
—
Eu terei. — ela permitiu mais um beijo nos lábios, uma despedida que durou uns
poucos segundos, mas que foi quase eterna. E quando entrou no elevador, viu o
carro dele parado na portaria, ainda a observá-la.
Subiu,
precisava conversar com Andrew, perguntar o que ele achava que ela deveria
fazer. Arriscar e pagar o preço ou ser mais uma vez covarde, como fora a vida
toda e outra vez se arrepender? Aquele homem tinha razão, passara a vida toda à
espera do amor verdadeiro, do conto de fadas que toda mulher espera viver. E
agora ele era real e ela estava apavorada! Por que a felicidade causa medo? Por
que seria mais fácil conformar-se com a infelicidade e pensar que só as outras
pessoas é que são felizes, que têm uma vida perfeita, de uma forma como ela
jamais poderia ter? Estava tão acostumada a não ter o que desejava que agora
que tinha, não sabia o que fazer.
—
Oh! Andrew! — disse apenas, e atirou-se nos braços do amigo, começando a
soluçar. Andrew apenas abraçou-a e esperou até que se acalmasse. Então
sentaram-se na cama e, de mãos dadas, começaram a conversar.
—
Acho que você tem uma decisão a tomar. Ele lhe pediu que ficasse, não é?
—
Não, exatamente. Pediu-me que o seguisse.
—
E o que você disse?
—
Que eu estarei lá amanhã, mas que não estou preparada para estar pelo resto da
minha vida. — ela hesitou um instante, então continuou — Ainda que me reste bem
pouca.
—
Eu vou lhe fazer uma pergunta e quero que me responda com toda a sinceridade.
Você o ama? Veja bem, eu não estou perguntando sobre a responsabilidade de
salvar a vida dele, que você acredita ser sua, nem sobre as experiências de
suas vidas passadas, quero saber se você se apaixonou por ele agora, nesta
encarnação. Quero saber o que você sentiu quando esteve com ele e o que você
sente quando o vê.
—
Eu não sei muito bem, Andrew. É difícil julgar os sentimentos. A única coisa
que sei é que o conheço como se ele sempre tivesse estado ao meu lado. Quando
eu o vi pela primeira vez, reconheci-o imediatamente, como você sabe. Até
então, pensava que poderia mesmo tratar-se de uma mera coincidência, ou de uma
lembrança adormecida das vidas passadas. Mas quando eu o ouvi, tive certeza. A
voz era para mim mais familiar do que a aparência poderia ter sido. Depois
daquela noite eu fiquei mexida, sim. Mas levantei a guarda, porque eu não posso
me apaixonar agora, pois eu não quero que ele sofra quando eu partir.
—
Mas o amor tantas vezes independe da vontade de quem ama... Feche os olhos e
sinta, você o ama? Não quero saber se está resistindo a este amor, só sinta e
me conte o que está sentindo. Não resista, não mate esse amor, por mais que ele
seja breve para você. Deixe-o sair, não o aprisione no seu coração teimoso,
solte-o. Você não vai conseguir sufocá-lo por muito tempo, ele é muito poderoso
e vai sufocá-la também, então, para que se torturar? Não se prive disso, minha
amiga, eu lhe peço! Eu estou vendo o amor crescendo dentro de você e eu também
o vejo nele... E hoje eu vi também a grande tristeza que ele traz dentro de si,
os sofrimentos que são cicatrizes impressas na alma dele. Ele está muito
machucado, muito machucado...
—
Eu o machucaria mais ainda se lhe desse esperanças, se fizesse promessas que
nunca poderia cumprir. Eu não pude prometer que estarei sempre ao lado dele. Eu
não poderei estar.
—
Acredite, o amor opera milagres! Quem sabe você foi eleita para um destes
milagres? Não duvide da força do amor, ele move as montanhas, derruba as
barreiras, nada é impossível para o amor. O simples fato de o amor existir
dentro das pessoas, já é um milagre por si só.
Você é uma das privilegiadas, por que carrega esse sentimento com você.
—
Mas eu não me sinto privilegiada, Andrew. Eu me sinto condenada, e sozinha. E
me sinto uma carrasca por não poder curá-lo, arrependo-me de ter vindo atrás
dele, eu causei um mal maior fazendo isso. Eu queria ir para casa, sair correndo
e sumir, mas ao mesmo tempo, eu odiaria ter que deixá-lo e não me conformo que
isso tenha que acontecer em breve.
—
Não precisamos ir amanhã. Temos dinheiro o suficiente para ficar ao menos mais
uma semana, ou para ir com ele para onde ele for, mais duas ou três vezes.
—
Você sabe que não é a isso que me refiro. Penso na hora de ir embora deste
mundo, de deixá-lo aqui sozinho.
—
Isso pode não acontecer, o seu caso pode ter solução, sim.
—
Vocês dizem isso só para me animar, mas eu sei que não é assim na prática. Se
tivesse solução já estaria resolvido.
—
Não é assim, Natália. Você é que não quer ver a realidade.
—
Seja como for, minha vontade é de fugir dele, para o mais longe possível.
—
Creio que ele a seguiria, como você o seguiu. Seria engraçado, quando um é o
gato, o outro se torna o rato. —Andrew sorriu, mas Natália pareceu indiferente.
—
Ele não poderia. Já tem seus compromissos a honrar. E mesmo que pudesse, acho
que ele está atraído por mim, sim, mas até onde isso poderia ser amor? Ele é um
homem desejado por muitas mulheres, por que me escolheria?
—
Por que duas almas gêmeas se reconhecem quando se encontram. Porque eu vi
dentro dele, e posso lhe garantir que ele não está brincando com você. O amor
não vê classe social, querida, não vê dinheiro, não vê beleza exterior e nem se
importa com o estado de saúde. Se estiver procurando um motivo para ficar com
medo e para desconfiar dele, não use esse.
—
Eu acho que não fiz outra coisa desde ontem à noite, senão procurar um motivo
para me livrar dele, sem ressentimentos, sem culpa, e sem me arrepender. Não
encontrei ainda.
—
Então pare de procurar! Isso não existe! Solte-se, permita-se viver essa
paixão, essa aventura! Não perca a sua vida nem deixe que ela tenha sido em
vão!
—
E quando o sonho acabar? Quando eu acordar, quando cair das nuvens?
—
Se cair, será sinal de que você subiu, que sonhou. Se nunca tentar, como poderá
saber?
Natália
não respondeu. Andrew tinha lá suas razões, mas o coração dela doía cada vez
que se lembrava dele, que ouvia seu nome. O desejo era proporcional à dor e a
vontade de fugir, que sentia toda vez que ele se aproximava. Caminhou até a janela e tentou olhar para o
céu, além das altas paredes de concreto que se erguiam na edificação vizinha, e
que era a única vista do pequeno quarto de fundos do hotel barato. Desejou que,
se houvesse mesmo um Deus lá em cima, fizesse um milagre por ela, e sentiu-se
pela primeira vez, iluminada.
Raquel Pagno
www.raquelpagno.com
Que lindo! Este capítulo me emocionou muito. Qual será a decisão da Natália? Enquanto eu lia os capítulos suspirava sem parar.
ResponderExcluirOlá Monica! Que coisa boa... adoro quando consigo emocionar um leitor. :D
ExcluirFico muito feliz quando consigo despertar sentimentos.
Obrigada pela visita! Beijos!
Bom dia Raquel!
ResponderExcluirTenho que arruar um tempinho para ler tudo! rsrsrsrsrrsrs
bjo bjo^^
Oi Ana Paula! Sim leia e não esqueça de deixar seus comentários, ok?
ExcluirBeijocas!
Gente! Desse jeito nunca acompanho os capítulos u.u
ResponderExcluirVou salvar mais os dois últimos e ver se leio esse fim de semana, assim semana que vem não ficarei meio perdida, haha.
Lê aí Rita! ;)
ExcluirE não perca na próxima sexta o último capítulo!
Beijos!
Nossa, nossa, que capítulo! *-*
ResponderExcluirEsperando ansiosamente pelo último capítulo para saber qual vai ser a decisão da Natália! Ás vezes é necessário só isso "Feche os olhos e sinta" =)
É isso aí Pamela!
ExcluirChegando a hora da decisão final de Natália. Até onde vale a pena ir por amor?
Não perca na próxima sexta! Beijos!
Eu comecei a acompanhar da Décima quarta lição, e gostei demais, e que capitulo foi esse hein? Você consegue criar toda uma tensão e eu gostei disso, vou colocando os outros capítulos em dias :P
ResponderExcluirBeijos, Carlos.
http://blogchuvadeletras.blogspot.com.br/
Olá Carlos Henrique! Fico imensamente feliz que tenha gostado. :D
ExcluirQuando puder ler os capítulos anteriores, deixe seus comentários pra gente, ok?
Obrigada pela visita! Beijos!
Oi Raquel,
ResponderExcluirdeusculpa eu ainda não li desde o começo, mas prometo que vou ler.
Beijinhos!
Ainda não pude ler desde o início mas sempre leio os comentários que é pra ver se eu me empolgo com a empolgação dos outros e começo logo hahaha Só vejo ótimos comentários, então assim que puder vou ler tudo desde o início ^^
ResponderExcluirVou começar a ler e em breve venho por aqui pra ir deixando minhas opiniões.
ResponderExcluir@_Dom_Dom