No Meu Mundo...

26 dezembro 2014


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CAPÍTULO 12

Ricardo ainda a esperava no corredor. Lia um jornal da semana passada e contou que também fora interrogado, informalmente, ali mesmo. Jéssica estava visivelmente nervosa. Sentiu-se acusada de crimes dos quais ela nem tinha conhecimento, ainda que não a tivessem acusado diretamente. Como ela poderia ter espancado pessoas até a morte? Era notável que não poderia. Também não conhecia ninguém “barra pesada” que pudesse tê-la envolvido em um caso como esse. Victor, apesar das sandices nas quais vinha fazendo-a acreditar ultimamente também não parecia se envolver com esse tipo de pessoas. Ele chegara a citar seu grupo de estudos, mas sempre se referiu a eles como sendo profissionais sérios e cultos, atuantes nas mais diversas áreas, principalmente ligados ao estudo, pesquisa e desenvolvimento e que não se assemelhavam de maneira nenhuma a baderneiros lunáticos ou fanáticos de qualquer espécie. Não poderiam ser eles os responsáveis pelos crimes.
Jéssica pediu que Ricardo a levasse de volta ao hospital, mas ele insistiu que parassem em uma lanchonete antes, visto que já era tarde e ela não tinha se alimentado ainda. Ela resistiu, mas estava mesmo com fome e acatou a sugestão.
— O que exatamente eles queriam com você? — perguntou ele, curioso.
— Não sei. Não entendi muito bem, mas parece que um bando de malucos. Segundo a polícia, é mais ou menos como se tivessem inventado uma nova religião, com direito a apocalipse, fim dos tempos, essas coisas que toda religião tem. Acho que, quando Victor e os seus amigos desvendaram os textos e suas traduções originais, esses caras se sentiram roubados e traídos. A intenção deles poderia ser divulgar sua própria versão, mas Victor e os outros descobriram suas mentiras. E agora eles estão se vingando dessas pessoas.
— Ou livrando-se das pedras nos seus sapatos?
— É, pode ser que tenham tentado matar Victor. Acontece que o delegado acredita que o tenham deixado viver de propósito, só para despistar qualquer suspeita que recaísse sobre ele e o seu grupo. A polícia acha que Victor foi cúmplice nas cinco mortes. Acham que se ele fosse inocente, teria sido morto também.
— Sim, mas ninguém cogitou a possibilidade de ter sido apenas uma tentativa de assalto, como tantas que vemos todos os dias? E se não houver conspiração alguma e tudo não passar de um grande mal entendido?
— Você tem razão. Acho que não há com o que nos preocuparmos. Mesmo que o delegado esteja convencido de que Victor tenha alguma coisa a ver com isso, as investigações vão provar o contrário.
Terminaram o almoço improvisado e voltaram para o hospital. Victor continuava inconsciente, mas os médicos garantiram que o coma era induzido e que seu quadro era estável. Mesmo assim, Jéssica queria ficar ali até que ele acordasse. Precisava perguntar-lhe sobre o que acontecera e queria saber tudo sobre o que acontecera, porque até agora, ninguém tinha sido suficientemente claro com ela. Tinha que entender para se proteger de um possível ataque, pois se já sabiam até mesmo onde ela morava, era bem possível que a estivessem seguindo, como Ricardo suspeitava.  Mas não deixaria que a machucassem, nem que voltassem a perturbar a vida de Victor para El Salvador. Se o delegado tivesse razão e a conspiração fosse mesmo verdadeira, ela mesma teria que agir por Victor e impedir que seu nome fosse jogado na lama. Ele não era um monstro como eles pensavam e ela sabia disso melhor do que ninguém. Ainda mais depois de ouvir a sua história, mesmo que incompleta. Victor era apaixonado pela vida e tinha um grande respeito por seus semelhantes. Jamais compactuaria com assassinos. Nunca! Ela sabia.
O médico passou apressado pelo corredor em frente. Ricardo percebeu que fora chamado com urgência até o quarto onde Victor era mantido. Jéssica parecia não ter-se dado conta. Ele achou melhor não comentar. Passaram alguns minutos até que o médico saísse da UTI e se dirigisse até ela. Ricardo se aproximou, queria ouvir melhor o que eles conversavam.
— Você é da família do padre?
— Não, sou uma amiga — respondeu ela.
— Precisamos contatar alguém da família. Ele terá que passar por uma nova cirurgia para a retirada de um coágulo no cérebro, mas só podemos executar esse procedimento com autorização da família.
— Coágulo? Oh, meu Deus! Ele é italiano, como o senhor já sabe e não tenho nenhum endereço, ou número de telefone de qualquer pessoa da família. Nem sequer sei se ainda tem alguém vivo.
— Então deve entrar em contato com alguém da Igreja, ou de onde ele mora, precisamos dessa autorização com urgência, ou então...
— Ou então?
— Não sabemos quanto tempo levará para que o coágulo se rompa e se isso acontecer não teremos mais o que fazer.
— Mas o senhor garantiu que o quadro dele era estável, algumas horas atrás. Como pode agora estar dizendo uma coisa dessas?
— Só recebemos os resultados dos exames agora e embora o coágulo esteja alojado muito próximo do cérebro, ainda não afetou nenhuma parte vital, como visão, audição ou coordenação motora. Foi muito difícil detectá-lo. Agora, por favor, apresse-se se quiser que salvemos seu amigo. — O médico virou-se e entrou novamente pelo corredor estreito. Ricardo aproximou-se e tocou o ombro de Jéssica.

— Vamos até a casa paroquial onde ele morou durante esses últimos meses. Com certeza encontraremos alguma pista de sua família. Ele deve ter uma agenda telefônica ou coisa parecida, não é? Nessa idade geralmente a memória já não é mais a mesma. — O bom humor de Ricardo a agradava. Ele tinha o dom de tornar as coisas fáceis, mesmo que não parecessem. 

Raquel Pagno
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